Consultoria Avra busca trazer empresas menores do agro para o mercado de capitais
O setor agrícola já não é mais um completo estranho para o mercado de capitais. O financiamento do setor via instrumentos financeiros, como fundos de investimento em cadeias agroindustriais (Fiagros) e certificados de recebíveis do agronegócio (CRA), atingiu cifras bilionárias. Mas está longe de ser o suficiente para diminuir a dependência de recursos subsidiados pelo governo e fazer jus ao tamanho do segmento, responsável por cerca de um quarto do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro.
Os títulos do mercado de capitais atendem a menos de 20% da demanda de crédito do agro, ressalta Octaciano Neto, reconhecido como um dos maiores entendedores do setor na Faria Lima. “Temos menos de 1 milhão de investidores, no Brasil, investindo em títulos clássicos do agro no mercado de capitais”, afirma, comparando o número com a quantidade de investidores de fundos imobiliários – mais que o dobro. “A indústria da construção civil é 8% do PIB, um terço do agro”, exemplifica.
Ex-secretário de agricultura do Espírito Santo em um dos mandatos do governo de Paulo Hartung, Octaciano passou os últimos dois anos na função de diretor de agronegócios da Suno, de Tiago Reis. Saiu recentemente para lançar a própria consultoria, a Avra, com o objetivo de trazer, para o radar do investidor, empresas menores, ainda bem distantes do mercado de capitais.
Falta de ativos e análise de risco
“Existe um desafio importante de falta de ativos”, diz o executivo. Essa, inclusive, teria sido a razão pela qual tantos Fiagros sofreram por conta dos problemas financeiros da Agrogalaxy (AGXY3), que recentemente entrou em recuperação judicial. “Tinha muito fundo com esse papel e isso acontece porque há poucos ativos.” Enquanto isso, segundo Octaciano, há operações saudáveis e rentáveis que não transitam pela Faria Lima. E são essas que a Avra quer levar para a mesa dos emissores de títulos.
“Existem empresários, produtores rurais, que não têm resultado auditado ou sequer reportam balanços, por operar na pessoa física. Mas que trabalham com margens espetaculares”, afirma o executivo. “No agro, a análise de risco não pode ser ancorada apenas em governança ou em balanço auditado. Não digo que não seja relevante, mas é uma ancoragem insuficiente para analisar o setor. Eu preciso olhar para a operação”.
Avra e SP Ventures
Para colocar a Avra de pé, Octaciano se juntou a Amanda Coura, que também atuou como diretora da Suno. A SP Ventures, gestora de venture capital especializada em agronegócio, também entrou na consultoria como sócia minoritária. E de forma inédita, investindo dinheiro do próprio caixa, em vez de um aporte via fundos, como costuma fazer com suas investidas. Na Avra, a SP Ventures é uma co-fundadora.
“Não vamos trabalhar no negócio, mas entramos como acionistas, apoiando do zero”, explica Francisco Jardim, sócio-fundador da SP Ventures. O gestor, que possui algumas fintechs do agro em seu portfólio, avalia que o mercado de crédito agrícola está passando por um processo de digitalização. Isso, junto ao que chama de “aprimoramento regulatórios”, cria um apetite do investidor institucional pelo setor.
Crédito agrícola
Segundo levantamento da Serasa Experian, 426 produtores rurais fizeram pedidos de recuperação judicial entre janeiro e setembro deste ano. Outras 299 empresas do setor foram pelo mesmo caminho. Apesar de os números terem crescido de forma expressiva em relação a anos anteriores, Octaciano os considera muito pouco expressivos.
“Isso dá menos de 2% do crédito brasileiro e está dentro do padrão de inadimplência que os bancos estão acostumados a operar. […] Não há um problema estrutural no agro. O que tem, é desconhecimento”, conclui Octaciano.
Júlio Rossato