STF torna Bolsonaro e aliados réus por tentativa de golpe
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, nesta quarta-feira (26), tornar réus o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e sete aliados por uma suposta tentativa de golpe de Estado. A decisão foi tomada por unanimidade, com cinco votos a favor da aceitação da denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR), incluindo os ministros Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin.
A denúncia também inclui outros 33 denunciados, mas, para facilitar a análise das condutas, a Procuradoria-Geral da República (PGR) dividiu a acusação em cinco núcleos. O grupo, que engloba o ex-presidente, foi o primeiro a ser analisado pelo STF.
O recebimento da denúncia pela Corte é uma etapa preliminar, na qual os ministros entenderam que havia evidências suficientes para avançar com a ação penal. Agora, com a denúncia aceita, o processo segue para a fase de instrução, onde ocorrerão depoimentos de réus e testemunhas, além de outras diligências para esclarecer os fatos e reunir provas adicionais.
Além de Bolsonaro, outros sete aliados se tornaram réus. Eles são: Bolsonaro e os outros acusados são imputados por liderar uma organização criminosa armada, que teria se associado para atacar a democracia brasileira.
A denúncia se baseia em um relatório da Polícia Federal, que aponta o ex-presidente como o principal articulador de um plano para impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2023. O ex-presidente teria participado de reuniões com militares e ministros para discutir um golpe de Estado, que, segundo a acusação, envolvia o uso de violência e grave ameaça.
Segundo a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR), acatada pelo STF, se condenados, eles podem enfrentar penas que chegariam a até 43 anos de prisão.
Moraes também reafirmou que a denúncia descreve de forma satisfatória os fatos e a participação dos denunciados, ressaltando que este momento processual não é para avaliar a absolvição ou condenação, mas apenas para verificar a materialidade dos crimes.
O primeiro dia de julgamento foi dividido entre uma sessão pela manhã e outra à tarde. Durante a manhã, os advogados dos oito denunciados apresentaram suas defesas, contestando as acusações e alegando diversas nulidades no processo. À tarde, os ministros rejeitaram todas as preliminares levantadas pelas defesas, que questionavam desde a legalidade das provas até a imparcialidade dos julgadores.
Um dos pontos centrais do caso é a delação premiada de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro. A colaboração de Cid com a Polícia Federal foi crucial para a investigação, e ele forneceu detalhes sobre a elaboração de uma minuta de decreto que visava criar um “estado de defesa” para reverter o resultado das eleições de 2022.
No entanto, as defesas dos acusados questionaram a legalidade dessa delação, alegando que Cid teria sido pressionado pela Polícia Federal e que sua colaboração não deveria ser considerada legítima.
O ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, refutou essas alegações, destacando que Cid fez sua colaboração de forma voluntária e sem irregularidades. O ministro também ressaltou que a delação de Cid é apenas um dos elementos de prova da denúncia, que também é sustentada por outros documentos e indícios que confirmam a trama golpista.
Os advogados dos denunciados também pediram a suspeição dos ministros Alexandre de Moraes, Flávio Dino e Cristiano Zanin, alegando parcialidade. Esses pedidos foram rejeitados pelo plenário do STF, que considerou que as controvérsias sobre a imparcialidade dos ministros já haviam sido analisadas e superadas em sessões anteriores.
Além disso, as defesas questionaram a competência do STF para processar e julgar o caso, argumentando que os acusados não possuem mais foro por prerrogativa de função, o que deveria transferir o julgamento para a primeira instância. O relator, Alexandre de Moraes, lembrou que o STF reafirmou sua competência para julgar todos os crimes relacionados aos eventos de 8 de Janeiro de 2023, tendo tratado de mais de 1.400 ações relacionadas àqueles fatos.
Os advogados de defesa também pediram que o julgamento fosse realizado no plenário do STF, e não na Primeira Turma, uma vez que o ex-presidente é uma figura política de grande relevância. No entanto, o ministro Luiz Fux foi o único a votar a favor da transferência para o plenário, mas sua posição foi vencida. O regimento interno do STF determina que, desde 2023, ações penais sejam julgadas nas turmas para desafogar o plenário e deixar este disponível para decisões sobre questões constitucionais.
Com esta a primeira etapa do julgamento, e agora, com as questões processuais resolvidas, o tribunal seguiu com a análise das evidências apresentadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR). Por unanimidade, os cinco ministro da Primeira Turma aceitaram a denúncia e tornaram os oito envolvidos, incluindo Bolsonaro, réus.
Enquanto o Supremo Tribunal Federal formava maioria para acatar a denúncia contra Jair Bolsonaro, o ex-presidente se manifestou nas redes sociais, criticando o andamento do julgamento. “A julgar pelo que lemos na imprensa, estamos diante de um julgamento com data, alvo e resultado definidos de antemão. Algo que seria um teatro processual disfarçado de Justiça – não um processo penal, mas um projeto de poder que tem por objetivo interferir na dinâmica política e eleitoral do país”, escreveu Bolsonaro em seu perfil no X (ex-Twitter).
Logo após encerrada a sessão, Bolsonaro, agora réu, falou com jornalistas em frente ao Congresso. Jair Bolsonaro rebateu as acusações de tentativa de golpe de Estado e continuou sua defesa sobre os acontecimentos de 8 de Janeiro de 2023. Em suas manifestações, o ex-presidente reiterou que as acusações são “muito graves e infundadas”.
Bolsonaro também afirmou que, durante o processo de transição de governo, pediu para que os manifestantes que estavam acampados fossem desmobilizados, mas que seu pedido não foi atendido. O ex-presidente destacou que sempre procurou agir dentro dos limites da legalidade e que, após sua derrota nas eleições, tomou todas as medidas necessárias para garantir a transição pacífica do poder.
“Ato contínuo, começamos a transição. Alguns dias depois desse pronunciamento, Augusto Heleno começava a passar o governo. Eu fiz um pronunciamento para os acampados desmobilizassem. Descumpriram esse pedido meu”, explicou o ex-presidente. Ele ainda frisou que suas intenções nunca foram de criar caos no país, mas sim de manter a ordem durante o processo de transição.
Em relação ao golpe de Estado, Bolsonaro reiterou que não houve qualquer intenção de dar início a um golpe, afirmando que as acusações não fazem sentido. “Golpe tem conspiração com a imprensa, com o Parlamento, o Poder Judiciário, setores da economia, Forças Armadas, empresários, agricultores. Aí você começa a gestar um hipotético golpe. Nada disso houve”, disse.
Bolsonaro também criticou a atuação de Alexandre de Moraes, que, segundo ele, tem criado uma narrativa distorcida sobre o que aconteceu, afirmando que o ministro tentou justificar sua interpretação de um golpe ao associar o evento de 8 de Janeiro a uma teoria premeditada que ele começaria a gestar desde julho de 2021.
Agora que a denúncia foi aceita pelo STF, o processo seguirá para a fase de instrução, onde mais provas serão analisadas, e as partes poderão apresentar suas alegações finais. A defesa de Bolsonaro e dos outros réus poderá contestar as provas e questionar os argumentos apresentados pela Procuradoria-Geral da República.
Caso os réus sejam condenados, eles poderão recorrer da decisão, o que pode prolongar o caso. A expectativa é que o julgamento final aconteça até o final de 2025, a fim de não interferir nas eleições de 2026. Se condenados, as penas podem somar até 43 anos de prisão, mas a execução da pena só ocorrerá quando todos os recursos forem julgados.
Júlio Rossato